PONTOS A PONDERAR...
Sérgio A. O. Siqueira
TERREMOTOS
Consórcio
dos Jornalojistas Funestos – Globo, Extra, Estadão, Folha de S. Paulo e os
portais G1 e UOL com rebarbas da CNN: “Terremoto de magnitude 7 abala Turquia e
Grécia – seis pessoas morreram na Turquia e duas na Grécia”. A notícia é que o
jornalojões já sabem a causa mortis: Covid-19.
MEUS TERREMOTOS,
OU: QUANDO SETEMBRO VINHA...
Passei por
dois terremotos na minha vida de reporteiro ambulante. Ambos foram em setembro,
com dez anos de diferença entre um e outro.
O primeiro foi na Cidade do México;
que quase me mandou para as calendas gregas antes do segundo, que se deu em
Atenas, no tempo em que ainda havia beleza e mistério na Grécia.
O PRIMEIRO
TERREMOTO
Esse tremor da
Terra intenso e destruidor, se deu no ruidoso setembro de 1985, na Cidade do México.
Eu e Remi Gorga, o tradutor brasileiro preferido de Garcia Márquez, estávamos a
serviço da Cultura brasileira na capital mexicana.
Provamos de tudo um pouco e bebemos, de tudo quanto bebemos,
mais do que cervejas Sol e Corona, alternada e seguidamente, uma Margarita atrás
da outra, como se Margarita não fosse uma bomba com feitio de coquetel à base
de tequila, sal, suco de limão e licor de laranja.
Do que nosso estômago aguentou comemos de Mole
Poblano, aquele frango com calda de chocolate salgada, até os
tradicionais Burritos, coisa com cara e
feito de sanduíche enrolado numa tortilla de trigo, que leva diversos tipos de
recheio. Escapei do tal Chapolín
Frito, aqueles grilos fritinhos que imitam perfeitamente um
camarão crocante e, com os quais, Remi Gorga se fartou.
Pois, então,
tomamos todas, naquela passagem do dia 18 para a madrugada de 19 de setembro.
Chegamos no hotel, num fusqueta ‘carocha’ pintado de verde e amarelo,
encomendados por antecipação desde o hotel, para escapar do tradicional risco
de sequestro, marca registrada do serviço de táxi em México City.
No penoso
amanhecer que sobreveio, acordamos cambaleantes, eu e Remi Gorga, nos aposentos
contíguos que ocupávamos. As paredes pareciam tremer; parecia que os móveis
dançavam; o apartamento balouçava pra lá e pra cá. Então falei para o Remi, em tom
de papo furado:
- Orra,
meu... ! Que porre. Tá tudo balançando.
- Tá
mesmo... Vou telefonar para a portaria e pedir uma caixa de Engov...
Dito e
feito. Remi pegou o telefone e ligou para o serviço de quarto:
- Hola, ¿qué
está pasando, señor?
- ¿Qué
quieres decir con qué está pasando?
- Nada,
nada, señor es sólo un temblor.
- Oh, bueno,
es sólo un temblor... Heeein, un temblor?!? ¡Es un terremoto!
- Sí, sí,
señor, un terremoto, pero...
- Pero, una
privica! ¡Cierra la cuenta, hombre!
Em cinco minutos,
nossas malas estavam prontas. E nós batíamos cabeça dentro do fusqueta verde e amarelo
que zunia pelas ruas ainda inteiras da Cidade do México,(*) rumo ao aeroporto
Benito Juárez que, digo a bem da verdade, nunca mais eu vi nem quero ver de
perto.
(*) – Já no
Brasil, são e salvo, vi pela TV que fora um violento
terremoto ocorrido às 7 horas daquela manhã de 19 de setembro, com seu
epicentro no mar de Michoacán, litoral mexicano, chegando à Cidade do México
numa magnitude de 8,3 na escala Richter. Deixou um rastro de destruição e morte.
Mais de dez mil mortes, contaram os jornalojões do mundo inteiro. Ninguém falou
que a causa mortis foi Covid-19.
O SEGUNDO
TERREMOTO
O segundo
abalo sísmico que padeci nem senti. Foi no setembro de 2004, em Atenas. O
epicentro do terremoto de magnitude 7 na escala Richter, foi a 350 quilômetros longe
do hotel Palace, onde eu estava na capital da Grécia. Deu-se o rugido da terra
no meio do mar que banha as Ilhas Gregas.
Naquela
noite, cheguei por volta de uma, uma e meia da madrugada no hotel e a luz do
ar-condicionado do meu apartamento bailava como se fosse uma deusa nua; deusa
grega e nua, inteiramente nua, é claro. Pensei que o tremelique era coisa do
meu pileque. (*) Dormi.
De manhã,
coisa de sete horas da matinata, toquei na porta do banheiro e levei um choque:
as paredes tremiam numa intensidade tal que davam a impressão de que estavam
eletrificadas.
Fui me dar
conta de que tinha sido um terremoto, quando na hora do café no terraço do
hotel, vi centenas de janelas quebradas, algumas casas e alguns muros
destroçados abraçando carros e caminhões. Não vi corpos pelo chão. O estrago
maior ficou no fundo do Mar Mediterrâneo.
(*) – Era só
o que faltava, eu sair pelas quebradas de Atenas à noite e não tomar um porre
de ouzo, cantando ‘Garota de Ipanema’ ao som de um bouzouki emprestado pelos músicos
dos botecos de Monastiraki.
Um dia ainda
volto a Atenas. Só para tomar ouzo. Atenas é legal, porque você não precisa visitar
museus. Atenas é uma miscelânea fantástica de objetos de arte histórica a céu
aberto. Nem os terremotos derrubam tantos deuses.