CAIM & ABEL, A ORIGEM
Naquele entardecer divino, ao
leste do Éden, sem mais o que fazer, eu estava cofiando placidamente meus pelos
pubianos, mirolhando Eva trocar pela terceira vez naquele dia a mesma folha de
parreira, quando Caim chegou aos prantos e aos gritos de uma dor que me pareceu
lancinante:
- Paiê! Mãiê! Matei Abel... Matei
mermão Abel!
- Bandido, mataste teu irmão?! –
bradei furioso, em esperanto perfeito.
- Ó, malfeitor! Mataste teu único
irmão! – choramingou Eva, no mesmo idioma.
E foi então para que a história
oficial da vinda da primeira grande família para o planeta Terra não sofresse
solução de continuidade, que Caim explicou antes de dar no pé e ninguém, nunca
mais ter notícias dele:
- Mãe, mãezinha; pai,
paizinho...Olhaqui, a gente tava brincando de luta. De Batman e Robin. Eu caí
por baixo de Abel. Tentei me livrar, mas ele... Ele... Ele me comeu, pô!
Eu olhei para Eva e a fulminei
com cara de quem já tinha avisado que brincadeira de mão sempre acaba em
rompimento de, rompimento de, de... Bolas, a vida é um buraco!
Desliguei-me daquela mazanza e me
virei para excomungar Caim, o filho que nos restava:
- Seu viado! Robin, enrustido!
- Viado um cacete, meu pai!
Peguei uma pedra e esborrachei a cabeça dele.
E mais Caim não disse. Com uma
lágrima de dor nas costas e outra de saudade um pouco mais abaixo, saiu em
desabalada carreira rumo a lugar nenhum.
Nunca mais ele nos viu. E nem eu
e Eva o vimos outra vez na vida.
Caim nem sequer percebeu o
sorriso luxurioso que não consegui conter. Senti que crescia em mim o germe do
Garanhão de Pelotas.
MORAL
DA HISTÓRIA – Brinquedo de mão dá
rompimento.
A
PEDRA FUNDAMENTAL - Caim pode ter sido o
primeiro Robin; a primeira versão do protagonista passivo de uma cena que, muito
mais tarde, a civilização conceituou de viadagem; mas Abel – o primeiro Batman
da Terra, nunca foi o primeiro Garanhão.
Garanhão mesmo, ainda que movido
pela escassez de meios e forças circunstanciais da criação, fui eu. Eu que
comecei comendo Eva, minha irmã bastarda, posto que não tinha sequer avós e fui
comendo todas quantas eu e ela procriamos nas beiradas do universo.
E assim foi se povoando a Terra,
nessa promiscuidade criativa, até que os procriados foram se tornando adultos e
comendo uns aos outros, resultando nisso que aí está e que se chama humanidade.
O Éden, nosso lar, pela
localização geográfica, a gente descobriu depois, era tido e havido como
Pelotas – a pátria pequena que eu tenho no Sul.
Milhares e milhares de anos
depois, Caim fixou residência nos princípios do Cone Sul do Mundo. Filho do
Garanhão de Pelotas, ele também cometeu suas garanhices, ajudando a povoar o
globo terrestre. Mas quando isso se deu, já era um pouco tarde. Tarde pra ele.
Eu continuo andando por aí.
E para que nada fique a botar
caraminholas na cabeça de ninguém, Eva também continua por aí, firme, bonita,
forte y mui loca, sem qualquer sombra de ciúme.
Ela também é boa naquilo faz
igual a mim. Pô, aprendemos juntos, um com o outro. Só não carrega o meu nome;
afinal, nunca fomos batizados e quando nos mudamos para a Terra, nem sequer
havia juiz de paz.
Enfim, quer queiram quer não
queiram, o ciúme só existe onde existe amor; é uma consequência do bem-querer.
E eu sei muito bem que o que eu faço como Garanhão de Pelotas com a mulher dos
outros, as mulheres dos outros farão comigo, só para dizer que fizeram com o
Garanhão de Pelotas.
Eu sou bom, não sou?!?